DNA e a Dupla Hélice: 60 anos de festejos (e polémica) em torno do Prémio Nobel da Medicina e Fisiologia
Neste blog, publicamos em janeiro último um post sobre ADN: primeira microfotografia da estrutura em dupla hélice, em 2013
Hoje, festejam-se 60 anos da publicação que dava a conhecer ao mundo a estrutura do DNA, a molécula da hereditariedade, que existe em todas as células e determina a maioria das características dessas mesmas células e de organismos como nós, sere humanos.
Reproduzimos artigo do Público, sobre o mesmo assunto, e dando conta do Prémio Nobel atribuído a esta descoberta, de Medicina ou Fisiologia, mas com uma importância tal na Química, que poderia ter recebido o prémio também nesta categoria! Curiosa a referência a Rosalind Franklin e importância do trabalho desta cientista nesta descoberta e relativa falta de reconhecimento público e da comunidade científica. O que recupera a questão do papel da Mulher na Ciência e episódios da sua história em que, aparentemente, houve questões de discriminação de género nesta nobre atividade humana.
A dupla hélice do ADN podia ter dado um Nobel da Química
O 25 de Abril não é só o dia da Revolução dos Cravos. Foi também nesta data que, há 60 anos, uma das descobertas científicas mais essenciais do século XX foi anunciada.
A publicação pela revista Nature da estrutura em dupla hélice do ADN, a molécula que contém o património hereditário dos seres vivos e permite a replicação da vida, faz neste dia 60 anos. Em jeito de comemoração, a Naturerevela, na sua edição de hoje, 25 de Abril de 2013 (que este ano é a uma quinta-feira, o seu dia habitual de publicação), elementos inéditos sobre o processo que culminaria, em 1962, com a atribuição a James Watson, Francis Crick e Maurice Wilkins do Prémio Nobel da Medicina.
1953: na página 737 da sua edição de 25 de Abril, a Nature traz um curto artigo: Estrutura Molecular dos Ácidos Nucleicos - Uma Estrutura para o Ácido Deoxirribonucleico. Assinado por Watson e Crick, da Universidade de Cambridge, Reino Unido, arranca assim: "Vimos sugerir uma estrutura para o sal do ácido deoxirribonucleico (A.D.N.). Esta estrutura tem propriedades inéditas de considerável interesse biológico."
Com peças metálicas de tipo "mecano", Watson e Crick construíram, no seu laboratório, um modelo 3D a partir de radiografias do ADN obtidas por uma jovem cristalógrafa, Rosalind Franklin, que trabalhava com Maurice Wilkins, do King"s College de Londres, procurando também elucidar a estrutura do ADN.
O que é que se sabia naquela altura sobre a hereditariedade? Que os caracteres hereditários eram transmitidos por entidades chamadas genes; que os genes estavam nos cromossomas, estruturas que se dividiam em duas cópias idênticas durante a divisão celular, conferindo a cada uma das células-filhas um conjunto de cromossomas idênticos aos da célula-mãe; e que os cromossomas continham ADN. Assim, ao desvendarem a estrutura em dupla hélice do ADN, Watson e Crick permitiam um avanço absolutamente fundamental, que, aliás, também delineavam no seu artigo de 1953: "Não deixámos de reparar que a organização específica das bases [os "tijolos de construção" do ADN] por pares, que nós propomos aqui, sugere imediatamente um mecanismo possível para a replicação do material genético."
O trabalho de Watson e Crick começou a ser nomeado para o Nobel da Medicina [ou Fisiologia] a partir de 1960. Em Dezembro de 1961, Crick enviou a Jacques Monod, a pedido deste - que trabalhava no Instituto Pasteur em Paris com François Jacob (que morreu há poucos dias) -, nove páginas descrevendo o trabalho sobre o ADN, explicam hoje na Nature Alexander Gann e Jan Witkowski, do Laboratório de Cold Spring Harbor (EUA). Mas enquanto outros eminentes cientistas, também solicitados, nomeavam Watson, Crick e Wilkins na categoria de medicina, Monod preparava-se para os nomear, ao contrário do que se pensava até aqui, na da química. A prova disso é a carta de nomeação que Monod escreveu a seguir, recentemente descoberta nos arquivos do Instituto Pasteur. Todavia, os responsáveis pela atribuição dos Nobel consideraram a descoberta tão importante para a biologia que a escolha que se conhece acabou por vingar.
O relatório que Crick enviou a Monod em 1961 restabelece ainda uma justiça histórica. Acontece que, no artigo de 1953 na Nature, Watson e Crick apenas mencionavam Rosalind Franklin em passant, declarando terem sido "estimulados (...) pelos [seus] resultados experimentais ainda não publicados". A jovem cientista morrera em 1958 - e portanto nunca poderia ter sido incluída nas nomeações para o Nobel, mas muitos criticaram os laureados por terem menorizado o seu contributo. Ora, na sua carta a Monod, explicam ainda Gann e Witkowski, Crick já reconhecia claramente "a importância das imagens de Franklin para a determinação de certas características da estrutura do ADN".
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